domingo, 18 de dezembro de 2016

Curso de Jardinagem - Relato de uma experiência

   Após retornar das férias em julho, fui convidado à acompanhar a primeira aula do curso de jardinagem do "Projeto Parceiros da Cidade: Mãos amigas" executado pelo Ceprocamp (Centro de Educação Profissional de Campinas-SP). Não foi uma participação sem conhecimento de causa, pois desde o inicio da elaboração do projeto, estive presente no Fórum de População em Sit. de Rua, seminários setoriais, discussões no abrigo que trabalho e votações no legislativo. 
   Esse projeto começou a ser engendrado ainda em 2015, pensando na profissionalização e criação de uma oportunidade de trabalho remunerado para as pessoas em situação de rua. Era esperado que em 2016 o projeto Frente de Trabalho inicia-se em sua integralidade, mas por ser um ano eleitoral e a lei não permitir a criação de um incentivo financeiro nessa época, o mesmo foi adiado. Mesmo assim profissionais e usuários trabalharam pela realização de pelo menos o curso no momento. 
   Dificuldade e esforço marcaram todo esse projeto. Em uma aula aprendi que a arvore Ipe Amarelo costuma dar mais flores e com a cor mais viva após atravessar um período de intensa seca. Comparando com o nosso projeto, passamos por um período difícil como a seca, mas foi justamente por isso que despontamos flores maravilhosas, sendo no caso aprendizagens, experiências e vivências únicas.
   Acompanhando ao longo das aulas, fui me perguntando qual era o meu papel no espaço: De apenas um profissional que vai junto? Ou um mediador de relações, motivador e auxiliar de organização? Observando a prática e os retornos que ia tendo, fiquei com a segunda alternativa. No fundo eu estava mediando o diálogo entre os pares, "administrando" conflitos, motivando os estudantes para continuarem, refletindo sobre a experiência, auxiliando a turma em suas dificuldades. Estava sendo uma ponte necessária entre o desejo de aprender/participar e à realização/concretização.
 Olhando os estudantes estava nítido que mais que uma profissionalização, estava em cheque a construção de novos horizontes internamente a cada individuo; a auto-estima, animo e organização mental estavam sendo trabalhados, de forma indireta. Sementes sendo plantadas no coração de cada batalhador.
    Como psicólogo social e educador social, compreendo que esse fenômeno não estava se dando apenas nos estudantes, mas em todas as pessoas envolvidas. Desde a minha singela pessoa, passando pela Profa. Claúdia, pelo Coord. de projeto Toninho, até os profissionais que não estavam no dia a dia, mas apoiavam. Por isso e mais era tão importante ser sensível as intervenções adotadas. Cada pessoa tinha um significado/sentimento sendo edificado.
   A vulnerabilidade social que as pessoas em situação de rua enfrentam, como desemprego, fragilidade ou rompimento de vínculos sociais e familiares, falta de um sentido para a vida, dificuldades psíquicas e emocionais, não são exclusivos desse segmento, mas estão de forma acentuada neles. É um conjunto de fatores que influencia o indivíduo em sua ida para as calçadas. Não diferentemente, por vivermos uma sociedade opressiva, também experimentamos esses aspectos e que nos colocam em risco. Ficar em situação de rua é um acontecimento que pode ocorrer a qualquer um.
   Trabalhar e lutar pela transformação dessa realidade tão dura, envolve compreender que em certa medida, o público alvo são todas as pessoas. Uma que se encontra na rua e necessita de apoio para sua saída; e outra que ainda não estando, necessita de prevenção, que implica em cuidarmos da forma com a qual nos relacionamos, na forma como nos valorizamos, nas ideias que propagamos e no fortalecimento da comunidade.

Imagem: Peneirando areia no MIS; Ao lado de um jatoba de mais de 80 anos na Mata Sta. Genebra; No Viveiro Municipal de Arvores; E no Viveiro Municipal de flores

   A imagem acima representa o meu esforço nas aulas, sintetizando teoria e prática. A foto foi registrada em diversos locais do município de Campinas. Sendo que a estrutura proporcionada de poder estar visitando esses locais e tendo aula, proporcionou muita qualidade.
 Foram praticamente seis meses acompanhando homens e mulheres, conversando sobre o tornar-se jardineiro, falando sobre o processo de metamorfose em nossas vidas. 
   Concluo mais essa etapa do meu trabalho tendo sido reforçado o elemento psicossocial de minhas reflexões e intervenções. Essa experiencia ficará na minha biografia e entrará para a história de Campinas - SP. 

Deixo para os internautas ainda o discurso que proferi no evento da formatura na sexta-feira dia 16/12/2016. Repito um trecho da minha fala que segue no vídeo: 

"Como um buque de palavras entrego esse discurso como um muito obrigado à todos e todas!"


Rua Conceição
Michel Cabral

2 comentários:

  1. Parabéns, Michel! Que haja sempre luz em seus propósitos. Foi um prazer a vida ter proposto de nos cruzar nesse caminhar.

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  2. Que bom seria se houvesse mais espaços floridos em nossas cidades, e mais gente que sabe cultivar rosas. Parabéns, Michel.

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